terça-feira, 8 de dezembro de 2009

A Igreja e a Corrupção

"A Igreja Evangélica Brasileira é legitimadora da corrupção porque se associa ao Poder Público sem a crítica adequada. Seus líderes sobem nos palanques políticos, impõem as mãos sobre as cabeças de gente cujo pensamento está voltado apenas para seus próprios interesses e para o crime, dá e recebe condecorações de e para gente sem a menor credencial ética para isso, cede os púlpitos a bandidos, enfim, associa-se a gente que deveria estar presa, mas que usufrui da liberdade que o seu poder lhes permite adquirir. Aqueles que deveriam ser alvo de denúncia e profetismo por parte da Igreja são seus grandes amigos e aliados."

Texto enviado por e-mail para o blog Genizah por Henrique Moraes Ziller, membro da Igreja Metodista da Asa Sul, em Brasília – DF, é Auditor Federal de Controle Externo do Tribunal de Contas da União e Presidente do Instituto de Fiscalização e Controle. http://www.genizahvirtual.com/2009/12/igreja-evangelica-e-legitimadora-da.html

sexta-feira, 4 de dezembro de 2009

Você se escandaliza? O Fracasso e a frustração fazem parte da minha vida!



Como reconhecer, aceitar e conviver com a realidade de que seu ministério está numa fase de retumbante fracasso? Como lidar com a dúvida e a inquietante sensação de uma vida espiritual comum e extremamente frágil? Como administrar a horrível sensação de que a realidade do pecado é mais próxima para nós mesmos do que para a maioria das pessoas que conhecemos?

Nunca imaginei que o medo, a angústia e a frustração fosse o outro lado da 'moeda'. Nestes poucos mais de vinte e cinco anos de vida cristã, cheguei à conclusão de que é medíocre e sofrível o discipulado que os líderes de nossa denominação ministram aos novos cristãos, que diuturnamente nascem e morrem aos borbotões. São modelados na crença de que o sucesso é a consequência natural dos 'chamados', e que os escolhidos sempre se destacam positivamente nas empreitadas que a eles são confiados. Para a maioria dos cristãos modernos o insucesso é um sinal mais do que claro de que algo vai muito mal na vida espiritual do indivíduo. Obviamente, comigo não foi e nem é diferente!

Fazem-nos acreditar que somos homens sem razão para ter medo, que somos verdadeiros heróis, condecorados numa guerra na qual lutaremos meramente para cumprir tabela, pois a vitória para nós já foi conquistada, entraremos em campo somente para receber os aplausos e os troféus. Não nos ensinam que as pancadas não são de brincadeira. Esquecem de dizer que os nossos inimigos são reais, e ainda que suas armas não são de mentirinha.

Como é duro conviver com uma realidade totalmente oposta, que em absolutamente nada tem nada a ver com a falácia de uma ‘chamada especial’ para uma vida inteira de vitórias e sucessos. Acha forte o que estou dizendo? Observe com atenção as letras da maioria das músicas evangélicas atuais, ou então ligue seu aparelho de televisão em qualquer programa dos tele-evangelistas atuais. Não será uma surpresa se chegar à constatação de que não são mensageiros do verdadeiro evangelho de Jesus. O evangelho que é pregado nestas músicas e pregações não fala de outra coisa senão de uma vida triunfante neste mundo.

Não fomos preparados para admitir que na vida cristã Deus possa perfeitamente conviver com nosso insucesso. Que ao nos contemplar, do alto de seu trono de justiça, santidade e glória, Ele não nos julga pelos nossos feitos ou nossas qualidades. Sua opinião ao nosso respeito não se baseia em conceitos meritocráticos.

Pela graça de Deus, alguns cristãos percebem a tempo esse engodo, engendrado pelo adversário (entenda Diabo), uma doutrina perversa absorta na cultura evangélica brasileira, principalmente nos movimentos apelidados de ‘pentecostais’, que há muito tempo perderam sua identidade e consequentemente o direito de assim ser chamados. Estes cristãos querendo realmente seguir o exemplo e as pisadas de Jesus aprendem a duras penas a aceitar a idéia de um Deus que convive com os erros e fracassos dos seus filhos. Que nunca deixou de ser santo apesar das mentirinhas de Abraão. Que jamais deixou de ser justo apesar da falta de escrúpulos de Davi. Por que será que na Bíblia Deus nunca pretendeu esconder os erros de seus servos? Por que será que hoje nós agimos irremediavelmente ao contrário?

Como é confortador crer em um Deus que encara o desafio de nos santificar pelo simples fato de ser amor em essência, e pela sua imensurável bondade e graça. Quando me coloco no lugar de pessoas como Elias, percebo que desejaria a morte muito antes do que ele. No lugar de Moisés, num lampejo de heroísmo e de justiça sem causa, não teria matado apenas um egípcio. Daquela multidão que levou uma pecadora aos pés do Mestre que escrevia no chão, com certeza, e sem medo de errar, seria um dos acusadores mais entusiasmado. 

Neste momento de doce desilusão é muito contraditório por um lado sentir a dor do fracasso, e por outro saber que isso nada mais é do que a vontade de Deus para minha vida. Então, glória seja dada ao nome do Senhor!



Jesus breve virá!

quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

O Triunfalismo e a Teologia da Precariedade


Autor: Ricardo Quadros Gouvêa - Revista Ultimato

É normal nos enganarmos na vida (Jr 17.9) e na teologia (Jó 42.3; Rm 11.33). As igrejas cometeram enganos (At 6.1) e ainda os cometem. Olhando o quadro geral dos equívocos dos evangélicos, pergunto-me o que os causa. Talvez seja o triunfalismo, que precisa ser denunciado e contraposto a uma alternativa: uma teologia da precariedade.

Defino o triunfalismo como a crença equivocada de que, por sermos crentes em Cristo, devemos ser vitoriosos em tudo, jamais experimentando fracassos ou reconhecendo fraquezas físicas, morais, intelectuais e espirituais. Falta ao triunfalista o sentimento trágico da vida, um reconhecimento de suas limitações.

A arrogância evangélica triunfalista vai das certezas inamovíveis dos teólogos até as irreverentes demandas para com Deus. A teologia da precariedade foca nossa condição espiritual precária, intelectualidade precária, moral precária, na compreensão de que não somos chamados para ser anjos, mas humanos que andam humildes diante de Deus (Mq 6.8), sabedores dos nossos limites e bondosos para com os outros em “seus” limites.

O contraste começa na oração. O cerne da piedade precária é uma vida de oração fragilizada, modelada pelos Salmos, em que se busca comunhão e intimidade com Deus por meio da gratidão, da autoexpressão (inclusive frustrações, Sl 13.1), do autoconhecimento (Sl 90.8), da confissão (Sl 51.9), da sujeição (Sl 25.4) e da comissão (Sl 143.10), em oposição às infindáveis petições típicas da oração triunfalista, que pede mal (Tg 4.3), almeja vitórias terrenas e vê na oração uma solução mágica. A petição precária pede sabedoria e espiritualidade (Lc 11.13) para lidar com problemas e sofrimentos, encarados como algo normal, e prefere rogar com Cristo: “faça-se a tua vontade” (Mt 6.10).
 
Ser cristão não garante vitória em qualquer faceta da vida, da saúde às finanças, das ideias teológicas ao ministério. Dizem que não demandá-las de Deus é falta de fé (não sabem que “’tudo’ é vaidade”? Ec 1.2). Demonstram falta de contentamento (1Tm 6.6). Em Cristo temos vitórias espirituais: a justificação dos pecados, a santificação pessoal, a salvação eterna. Triunfamos sobre a morte espiritual sem nunca deixarmos de ser pecadores (1Jo 1.10). A jornada espiritual até a varonilidade de Cristo é fruto da ação paciente de Deus (Cl 2.8), livrando-nos do orgulho e da rebeldia que nos tentam a vida toda (Rm 8.19).

Seguir a Cristo é abnegação, é “tomar a cruz” (Mt 16.24). Não simplesmente sofrer, que é parte da condição humana (Tg 5.10), mas completar em nós os sofrimentos de Cristo (Cl 1.24) por meio do cumprimento de nosso ministério, assim como Cristo cumpriu o seu. Cristo não promete a seus discípulos uma vida fácil, com vitórias na vida financeira, na saúde e nos relacionamentos (Mt 10.5-23). Cristo e os apóstolos eram pobres, passavam por dificuldades (Hb 2.10), inclusive de saúde (Gl 6.11; 1Tm 5.23), e tinham toda sorte de complicações relacionais entre si (At 15.39; Gl 2.11). Estiveram presos, e viram isso como um privilégio e uma oportunidade (2Tm 1.8).

Ensina-se equivocadamente que tornar-se um crente em Cristo significa ter acesso a uma vida de bênçãos materiais e de vitória sobre todos os males que afligem o corpo e a alma. Uma revista evangélica recentemente anunciou em sua capa que Cristo é a solução para a depressão. Há, porém, muitos fiéis com quadro clínico de depressão, e isso nada tem a ver com pecado ou falta de espiritualidade. Há toda sorte de enfermidades físicas e psíquicas a que estamos sujeitos, cristãos ou não, e por meio delas somos instruídos por Deus e temos oportunidades ministeriais. Se recebemos de Deus o bem, não receberemos dele também todos os males comuns da nossa condição humana (Jó 2.10)? Deus torna os males em bênçãos (Gn 50.20). Procuremos descobrir qual o seu significado em nossa vida e ministério.

O triunfalismo torna os crentes presunçosos (Sl 19.13). Em vez de estarmos dispostos a compartilhar todas as mazelas da existência humana, e dessa forma nos tornarmos capazes de empatia, queremos estar acima delas, e de todos os que as enfrentam. Isso leva a uma vida de mentiras que contamos aos outros e a nós mesmos. Na verdade, temos em comum uma vida de sofrimentos, enfermidades, relacionamentos imperfeitos e fracassos. Nossa fé e nossa comunhão com Deus em Cristo não impedem que enfrentemos crises e problemas, que vivenciemos fracassos, doenças e tristezas, pois são parte comum e inevitável da vida de qualquer pessoa neste mundo caído no pecado.

A fé nos traz a esperança de um mundo melhor (Ap 21.14), a certeza de que tudo colabora para o bem (Rm 8.28), e de que nada acontece sem que Deus permita (Mt 10.29). Nossa comunhão com Cristo nos garante forças para suportar as aflições com paciência (Tg 5.11), e impede de sermos tentados pelo desânimo quando enfrentamos dificuldades na vida.

Quando somos transformados pela ação do Espírito Santo, nos desapegamos dos bens materiais, e até do desejo neurótico pela saúde plena do corpo e da mente. Desprendemo-nos até da vida biológica como valor em si, pois já morremos com Cristo para esta vida terrena (Cl 2.11-12), e vivemos agora em Cristo e para Cristo somente, sem medo da morte biológica (Fp 1.21).

O triunfalismo também está por trás do amor ao sucesso de lideranças evangélicas que priorizam o crescimento e nivelam o ministério eclesial com o empreendimento comercial secular. Têm por modelo os empresários bem sucedidos, ostensivamente ricos, ou as celebridades, e não os pobres caminhantes da Galiléia. Não percebem que ministério sem o sacrifício do prestígio é o sacrifício do ministério no altar do sucesso.

A piedade precária se contenta com ministérios desprestigiados e igrejas pequenas que encontram a sua força na fraqueza (2Co 12.10). Igrejas não precisam crescer, e não deveriam nem sequer almejar o crescimento, mas antes a fidelidade a Cristo e à vocação e testemunho cristãos. Igrejas não são fins em si mesmas, mas agências proclamadoras do reino de Deus. Por isso, elas podem ser provisórias, institucionalmente frágeis e, do ponto-de-vista secular do empreendedorismo, totais fracassos.

O triunfalismo efetua ainda uma atitude moral equivocada em que os crentes passam a se ver como mais puros e santos que os pecadores incrédulos. O cristão é santo porque foi “separado” para a missão de seguir a Cristo. O que nos diferencia dos ímpios é sermos pecadores conscientes do pecado e da necessidade da graça e do perdão de Deus, consciência esta que os ímpios não têm.

A moralidade triunfalista parte da criação de Deus, mas ignora a queda, e prega uma proposta de conduta idealizada, mais adequada a anjos que a homens. No paradigma da piedade precária, adota-se a redução de danos, pois vivemos em mundo caído. Então deixamos de negar que as famílias evangélicas são disfuncionais e encaramos os dramas morais dos evangélicos como o padrão, e não mais como exceções.

O triunfalismo também nos torna soberbos intelectualmente (1Co 1.20), ignorando os efeitos do pecado sobre sua razão. A piedade precária nos convida a uma teologia fraca em que se reconhece que as opiniões teológicas e morais são apenas aproximações. Somos como cegos apalpando nosso caminho; nossas formulações doutrinárias e interpretações bíblicas são fruto da reflexão humana historicamente condicionada.

O triunfalismo leva os evangélicos a achar que é errado ter incertezas e dúvidas, que é feio admitir a ignorância, que o questionamento é sinal de falta de fé. O cristão precário está sempre disposto a ouvir vozes discordantes, a aprender com quem pensa diferentemente, inclusive com os incrédulos. Podem-se aprender lições preciosas das pessoas mais incultas, bem como dos maiores pecadores e hereges, pois todos têm alguma lição a dar, e ninguém, além de Deus, é dono da verdade (1Co 8.1-3).

Convido todos os evangélicos a abandonar o triunfalismo, adotando uma teologia da precariedade: caminho da fraqueza, humildade, ignorância, resignação e desprendimento. Pensemos a comunhão com Cristo como uma jornada de santificação pessoal que implica os tremendos sofrimentos advindos do abandono dos desejos e concepções do velho homem (Ef 4.22), e não nas benesses de um favorecimento da parte de Deus que nos permita obter exatamente as coisas de que deveríamos antes nos desapegar. Abandonemos os desejos carnais pelo dinheiro, pela saúde, por longevidade, cujo preço é a decrepitude.

Sacrifiquemos nossa vida no altar divino (Rm 12.1). Abandonemos o desejo carnal por sistemas de pensamento que nos deem falsa certeza e tranquilidade (2Co 10.4-5). Que nossas opiniões sejam manifestadas com singeleza e reconhecimento da nossa imperfeição intelectual (Cl 4.6). Ambicionemos apenas que Cristo seja conhecido pelo nosso viver (Gl 2.20), ainda que saibamos desde já que também nisso fracassaremos, pois muitas vezes nossa carnalidade nos impedirá de exalar o bom perfume de Cristo (2Cr 2.14-17).


• Ricardo Quadros Gouvêa é ministro presbiteriano e professor da Universidade Presbiteriana Mackenzie e do Seminário Teológico Servo de Cristo.